terça-feira, 31 de março de 2015

Um conto de encantar

Luis quedou-se a olhar, olhos vivos numa cara macilenta, enrugada do tempo. Joana fazia o seu trabalho, desenvolta, movimentos naturais de mulher, olhos brilhante e um sorriso encantador.
Luis contava-lhe episódios passados e ela ouvia educadamente mostrando algum interesse. O tempo passava.
- Joana, para a semana já não venho!
- Vai-nos deixar? Assim de repente? O rosto ligeiramente ruborizado como se a notícia a tivesse afectado fazendo o coração de Luis dar um sobressalto.
- Tem de ser. Tenho de ir! A minha profissão a isso me obriga e tenho uns gatos para criar! Luis não perdia oportunidade de se referir á sua colecção de gatos, todos eles com as suas características próprias e personalidades diferentes embora todos felinos e ligeiramente "psycos".
Joana continuou a fazer o seu trabalho em silêncio procurando Luis algo mais no seu rosto jovem e bonito algum sinal de dor, de saudade. Luis tinha-se apegado á rapariga, silenciosamente começou a gostar dela, do seu sorriso, do seu toque, do carinho que tratava os outros mais necessitados, da sua simplicidade e do modo como ouvia Luis, transmitia-lhe um sentimento de importância, de ser querido, respeitado e desejado. Luis sabia também, tinha consciência de que a sua imaginação, os seus devaneios o faziam voar sobre uma realidade sonhada obrigado-o a conter-se com medo de estar a viver o que não existia.
- Quando se for embora não se esqueça de se despedir de mim! Atira Joana de repente. Agora tenho de ir lá dentro!
A rapariga saiu deixando-o sozinho com os últimos movimentos que Luis costumava fazer sozinho só que desta vez deixou-o com uma sensação de vazio, a despedida aproximava-se. O fim de um namoro que nunca existiu estava a chegar ao fim, a tristeza a galgar o seu interior fazia que os movimentos de Luis ficassem mais lentos parecendo querer eternizar aquele momento.
O fim chegou, era a hora da despedida e Luis procurou Joana cumprindo o seu desejo. Olharam-se e ela abrindo os braços deu-lhe um grande abraço beijando-o carinhosamente nas faces. Luis esperava uma despedida mais formal mas aquela tinha calor humano fazendo com que se tornasse mais dolorosa. A sua cara bonita, sorrindo com um ligeiro rubor nas faces dava-lhe uma beleza, uma graça.
- Obrigado Joana pela paciência de me aturar e pelo seu cuidado. Agradeceu Luis com uma vontade louca de a abraçar e beijar apaixonadamente, estava totalmente seduzido.
- Nada Luis você é uma pessoa interessante e gostei de o conhecer!
Luis sorriu sem demonstrar os seus sentimentos, com o coração acelerado afastou-se. Um amor não impossível mas de difícil concretização, Luis era casado, Luis tinha mais do dobro da idade da rapariga. Ela tinha um futuro pela frente, ele estava no futuro dele. Mas ele tinha-se apaixonado, estava apaixonado, gostava da sua presença, gostava do seu contacto e quando a encontrou numa rede social encantou-se com o sorriso sempre presente em todas as imagens. Aquela rapariga era uma querida tal como lhe tinha dito uns dias antes.

O tempo, não muito, passou mas as memórias  ficaram, avivadas pelas imagens recolhidas e gravadas nas gavetas da memória e do coração fazendo Luis ficar nebuloso e melancólico. A sua mulher há muito que sabia desta paixoneta e conhecendo bem o marido que tinha em casa estava divertida e só dizia que não queria saber de nada. Mas não deixou de fazer o aviso que se por acaso houvesse caso ela não repartiria espaços. Luis sossegou-a dizendo que nunca haveria caso mais por falta de vontade e juízo da rapariga do que por vontade e falta de juízo de Luis.

Luis embarcou, era marinheiro de profissão e assim afastou-se de tudo e todos voltando á sua vida solitária onde só lhe restam os sonhos e os momentos fugazes de uma despedida emotiva.

Luis querendo perpetuar o seu momento pegou numa folha de papel e começou a escrever:

"Luis quedou-se a olhar, olhos vivos numa cara macilenta, enrugada do tempo. Joana fazia o seu trabalho, desenvolta, movimentos naturais de mulher, olhos brilhante e um sorriso encantador....... ".



segunda-feira, 30 de março de 2015

Loucura

Sinto a loucura a encher o meu cérebro de minhoca.
Sinto-me que se me diminuem as capacidades
Sinto a loucura
Que me assola
Que me faz vibrar
Sofro e sou feliz
Felicidade infantil de quem já não é criança
Mas que age como tal
Que vive traquina
Traquinices de menino de cãs
Barba grisalha e macilenta
Olhar de lobo
Sorrindo
Esperando
Que a loucura expluda
Que a loucura brilhe

A noite não tarda em pôr-se
O entardecer com cores de fogo
O entardecer das terras da minha origem
Ardentes
Como a minha loucura
Espero, avanço, espero
De sorriso matreiro
Numa cara gaiata marcada pela vida
Que a minha loucura
Enfim se entregue.

28 de Março de 2015