segunda-feira, 15 de agosto de 2016

O círculo

Jonas flutuava no seio do nada, imerso num meio viscoso e negro que lhe tolhia os sentidos impedindo-o de qualquer movimento, de qualquer sensação. O negro da escuridão era atroz, fazia-o sonhar com a morte, aliás, sentia-se morto mas tinha consciência de estar vivo, apenas afogado no nada.
A sua mente estava entrar em turbilhão, acelerava a velocidade do raciocínio até tocar os limites do pânico. As ideias rolavam, as visões apareciam e desapareciam a uma velocidade alucinante. Jonas via-se nu deitado numa cama coberto por uma mortalha assim como corria como uma criança num areal enorme de uma praia longínqua, para além dos tempos. Algo o fazia lembrar, tempos idos, vidas vividas, outras eras quando estava ás cambalhotas, no ar, rodopiando loucamente, sobrevoando a morte, escapando ao esmagar dos ossos contra o metal que se lançava sobre ele. Jonas tentava respirar mas o nada esmagava-lhe o peito, asfixiando-o, levando-o para a caverna escura onde lutava para escapar á armadilha mortal.
Os acontecimentos sucediam-se uns atrás dos outros ao som de uma música pungente, dorida lembrando tempos idos, vidas amadas, dores alucinantes, medos atrozes. A pancada que vinha á velocidade de uma vida e que acabava numa explosão de dor que matava o espírito, marcando o inconsciente deixando incólume o corpo, esse corpo cheio de marcas invisíveis de uma vida de luta. Uma luta incessante que agora o inundava em vagas cada vez mais revoltosas a sua mente.
Essa mente que um dia viu a luz e passou a viver nas sombras, a luz que o cegou deixando-o com uma tristeza cada vez maior. Uma luz que ele via e reconhecia naquela música dorida e pungente. A luz que lhe trazia lágrimas aos olhos, sentindo-se um náufrago que tinha tocado na salvação e que agora se afundava num oceano de certezas sendo a morte uma delas, tinha tocado na bóia, tinha sentido a vida e agora morria, maravilhado pois tinha visto a luz.
Jonas tentava arfar, viu o sorriso juvenil daquela que ele, numa outra vida, tinha desprezado mas que a marcou até ao fim dos tempos, era um sorriso bonito, uma beleza que Jonas só passou a dar importância uma vida depois, quando tudo era negro, esse sorriso iluminava-lhe a alma. Agora, fechado no nada, flutuando no vazio, o seu corpo sendo sugado de toda a vida se encolhia tudo se resumia a esse sorriso. Jonas colapsou, o seu coração falhou uma batida e entrou numa arritmia louca levando-o para outras dimensões.
Jonas viu as estrelas, imensas estrelas quando descobriu que estava no meio de uma explosão, dor, medo, tudo em simultâneo mas vendo o universo a nascer, vendo a vida a aparecer, um carrossel de cores e radiação que o queimava, que o cegava não o impedindo, no entanto, de ver, a radiação entrava-lhe pelo cérebro afectando as suas células levando-lhe a mensagem. Jonas tentava decifrar aquele código que o bombardeava ininterruptamente até começar a ver com o espírito, há muito que o seu corpo se tinha dissolvido em átomos espalhando-se pelo tempo ocupando a totalidade do universo. Jonas começou a acalmar, o nada, o vazio onde estava mergulhado passou a ser uma realidade, uma melodia que o embalava. Flutuou feliz ao sabor da corrente, deixando-se embalar pelo calor, pelo pulsar do universo que o transportava para o negro, para a escuridão que a velocidade alucinante o puxava, o atraía. A dor começou a ser grande, a aumentar, a pressão que o esmagava, o craneo comprimido deformava-se.
Jonas sentia-se afogar, o desespero a aumentar, a dor, as luzes brilhantes e, sem aguentar mais, com sofreguidão aspirou o ar que lhe queimou os pulmões, fazendo-o gritar de dor. E Jonas chorou como nunca tinha chorado antes, antevendo um futuro de dor.
- Nasceu! Um belo rapaz que berra a plenos pulmões! Exclama o médico sorrindo segurando um bebé pelos pés, roxo de tanto gritar.

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Nobita escreveu: