segunda-feira, 25 de maio de 2015

Jonas 8 - O renascer

A eternidade passou num ápice, Jonas abriu os olhos e sobressaltou-se, aqueles grandes olhos verdes que o miravam expectantes assustaram-no. Fez um gesto de defesa, inútil pois estava amarrado á cama. Acalmou-se, aqueles olhos eram tristes, doces e pareciam suplicar algo que Jonas não entendia. A sua mente ainda num turbilhão, a ideias, as imagens, as memórias todas a saltarem ao mesmo tempo, Jonas fazia um esforço insano para as agrupara, para pôr um pouco de ordem de modo a que conseguisse dar um pouco de lógica aos últimos acontecimentos. O turbilhão era demasiado e aqueles olhos desconcentravam-no.
- Onde estou? Que me aconteceu?
- Aparentemente caiu e bateu com a cabeça! Exclama a rapariga, e, mudando de tom de voz ralhou. O menino está muito fraco para se levantar sem ajuda! Para a próxima tem este botãozinho, carrega e chama-me!
- Porquê esse olhar triste? Não me vai dizer que é porque eu não carreguei no botãozinho!
- Nada, não estou triste apenas cansada!
- De aturar malucos, não?
- Nem imagina! Exclama a rapariga afastando o olhar para a janela e olhando lá para fora, para o parque de estacionamento onde um vulto cabisbaixo entrava num carro e se afastava. Nem imagina quanto farta estou eu!
- Farta de aturar malucos sãos ou doidos como eu?
- É assim! Vira-se a rapariga com os olhos a faiscar. Se continuar com essas perguntas fico farta de aturar parvos. Já me chegam os malucos e os doidos.
- HummmmM para a próxima carrego no botãozinho! Que fúria. 
Jonas sorriu e deitou-se olhando para o tecto, a sua mancha lá estava.



O tempo passou assim como o dia, Jonas apenas pensava no que lhe restava das suas memórias, lembrava-se dos factos e esquecia-se dos nomes, lembrava-se das sensações e passavam-lhe as datas, a cronologia. 
De repente um cheiro veio-lhe á memória, um cheiro quente, suave, doce. Um perfume á muito enterrado no interior do seu consciente, o perfume de uma mulher que ele tinha amado profundamente, que ele ama ainda hoje, sabe que a ama mas é-lhe totalmente incapaz de se lembrar do nome. Olhos negros, sorriso brincalhão, cabelo cortado curto, cabelo que Jonas se lembra de adorar passar os dedos por aqueles cabelos a partir da nuca arrancando á sua amada arrepios que lhe deixavam a pele toda eriçada, os mamilos arrepiados para divertimento de Jonas. Era assim que começavam normalmente os seus jogos amorosos. Beijava-lhe o pescoço aspirando o seu perfume, o seu cheiro, mordia-lhe a nuca como os animais fazem ás suas fêmeas para as dominar, esta nunca se tinha deixado dominar, era brava e por isso Jonas perdia-se sempre. E as memórias corriam mostrando uma vida que ele tinha tido e que agora estava totalmente desligado, não se lembrava, tinha-a perdido para algo, para alguém.
- Desculpe-me o meu mau génio á bocado! Exclamou a rapariga á porta do quarto. Não devia ter sido malcriada!
- Se calhar eu não devia ter sido parvo e estar com gracinhas com uma pessoa que se via que estava nervosa e ou cansada. Digamos, farta de aturar malucos. Exclama Jonas com um sorriso.
Já agora! Está mais bem disposta?
- Hummm! Já passou! E você? Tenho estado aqui a observa-lo e quase se podia ver as rodinhas dessa cabeça a rodarem a uma velocidade incrível, quase se podia ver o brilho de uma lagrimazita a querer escapar desses olhos. O que se passa?
- Memórias de tempos passados, memórias de amores e paixões que não regressam nunca mais, memórias e mais memórias.
- Entendo! Mas porque não põe para detrás das costas e segue em frente? Existe vida no seu futuro.
- Existe vida sim, mas eu sou aquilo que fiz e vivi,não quero pôr a minha vida para detrás das costas só porque causam dor. A minha vida é o único bem que eu tenho e que levarei comigo quando morrer. Quero-a toda presente.
- Mas isso deve-lhe ser bastante penoso. Sofrer de novo para quê? Passou e não se pensa mais nisso.
- Não é bem assim. Se sofri é porque houve algo de bom que se alterou e passou a causar sofrimento, eu quero esses pedaços bons de volta, quer lembrar-me deles, vive-los novamente nem que para isso volte a sofrer a sua perda.
- Se você está sempre a viver o passado não vive o presente nem terá futuro.
- Bem observado mas não é assim que acontece comigo. Vivo o passado, o presente é sempre o presente e vivo-o intensamente, esta conversa é um exemplo disso, está-me a dar prazer argumentar consigo com um início de tentativa de sedução ao mesmo tempo que já estou a fazer projecções para o futuro, a desenhar todos os possíveis cenários que esta conversa poderá produzir. Faço isto tudo ao mesmo tempo.
- Está-se a meter comigo, está a gozar-me! Replica a rapariga com um tom de voz ofendido.
- Estou a brincar, não a gozar. Existe uma grande diferença. E eu só brinco com pessoas de quem gosto. E a sedução é uma coisa que existe sempre entre um homem e uma mulher. Nós gostamos que o outro goste de nós, mesmo que seja só simpatizar, admirar. A sedução no sentido lato não implica sempre sexo. Embora, você como uma mulher muito bonita que é, seja difícil de não querermos seduzir.
- Oh! Não diga asneiras! Mas voltando ás memórias e á vida. Deve ser muito cansativo essa maneira de se viver, a sua cabeça não deve parar.
- Como tu disseste, vou tratar-te por tu pois como já me declarei e não levei chapaao acho que ganhei o estatuto de te poder tratar por tu. Como disseste, quase que podias ver as rodinhas do meu cérebro a trabalhar, é assim todos os dias, a toda a hora. Se descontraio, adormeço, de exaustão provavelmente. Mas não consigo fugir a este remoinho, sempre a lembrar, a viver e a projectar. Muitas vezes, quando interrompo, fecho os olhos e sonho, sonho vidas que nunca vivi e que nunca viverei, apenas na minha imaginação os vivo. Sonhos e fantasias, milhões de vidas. O problema é manter a coerência, não misturar os sonhos com as memórias reais.
- Se calhar é por isso que estás aqui. Replica a rapariga usando o tratamento por tu. Flipaste totalmente e queimaste os fusíveis. Bolas, não devia estar a falar contigo assim, afinal és um doente e eu não posso dizer estas coisas! Exclama a rapariga tapando a boca com a mão e corando como uma adolescente. 
- Não te preocupes! Desde que o digas quando estivermos a sós não terás problemas. Passa a ser o nosso segredo! Diz Jonas com ar malicioso.
- Hummm! Não estou a gostar muito desse olhar de felino!
- Claro que faço este olhar de felino. O segredo une-nos, dá-nos uma cumplicidade e é altamente sedutor. Eu gosto de seduzir. E quando vi esses teus olhos verdes, fui eu que ficou seduzido, agora vingo-me! Diz Jonas com um sorriso de criança de orelha a orelha.
- Parvo!!! Diz ela corando. Chega de conversa, tenho mais trabalho para fazer e outros malucos para aturar. Põe-te bom!
- Ana! Chama Jonas com um sorriso. Não tenho direito a beijinho de adeus!
Ana abriu os olhos de espanto, não esperava este rápido desenvolvimento, tinha sido apanhada de surpresa. Corou e apenas respondeu com a primeira coisa que lhe veio á cabeça.
- Nunca com a barba por fazer!! E saiu batendo com a porta.

Jonas sorriu, a rapariga agradava-lhe, era bonita sem ser uma estampa, tinha um olhar doce e meigo que o encantava, tinham sido aqueles grandes olhos verdes que o tinham seduzido. E Jonas começou a desenhar todos os cenários possíveis para uma futura relação até que adormeceu, já a noite ia longa.
Lá em cima, no escuro da noite, as estrelas brilhavam intensamente.


24 de Maio de 2015

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Nobita escreveu: